Texto publicado na revista Cavalo Árabe de novembro de 2012, distribuída durante a Exposição Nacional da raça:
Cheiro de carro zero quilometro, de café passado na hora, de mato após a chuva. Um potrinho que tenta se levantar pela primeira vez, o sol que surge no horizonte de um amanhecer.
A sensação do toque de um recém-nascido que agarra sua mão, o primeiro dia da escola. Conhecer o mar que nunca se viu. Abrir um presente. Acordar numa casa nova. Reencontrar um amigo que se achava perdido. Estrear seu cavalo numa exposição nacional. É tudo novidade, que pode ser fascinante, e que também pode amedrontar. O novo, o desconhecido, tem duas faces: a mais aparente e a oculta — esta pode nunca se mostrar, mas tenhamos certeza de que ela existe.
É preciso saber como abordar o novo. Com otimismo, com entusiasmo, com o benefício da dúvida. Ou com pessimismo, com desconfiança, com preconceito. Cada um escolhe suas armas e a estratégia de aproximação. Peito aberto ou armadura. Como o quero-quero que defende seu ninho e engana o incauto. Ou do jeito do cão que ladra, mas não morde. A poetisa Adélia Prado disse: “Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra”. Ela sabe que há mais coisas escondidas por baixo da mera aparência.
Outro item a considerar-se com relação ao novo é o que ele traz de igual ou diferente para quem o vê. Caetano Veloso afirma: “Narciso acha feio o que não é espelho”. Ou seja, de acordo com ele, o outro é tão fora dos padrões do que se conhece que causa estranheza. Eventualmente, até rejeição, mas talvez seja bom repensar o assunto. Tomemos como exemplo as histórias infantis, que tentam incentivar o olhar indagativo, investigativo, das crianças: a bela enxerga a alma valorosa da fera. O patinho feio se transforma num majestoso cisne. O sapo vira príncipe e a rainha é uma bruxa.
Ouvimos com frequência quando analisamos o produto de um novo garanhão: “Melhor aguardar o crescimento do potro, ver como ele se desenvolve.” — cá entre nós, esperar parece que vai desaparecer do dicionário muito em breve nesta era do imediatismo, da velocidade, da informação globalizada. Alguns sábios vão nos chamar atenção, lembrando-nos do tempo em que a raça do cavalo Árabe existe e resiste. Hora de dar uma volta para se distrair, “tomar um arzinho”, mastigar um capim gordura, assistir a um bom filme...
O filósofo L. Coutinho brinca que há uma raça de equinos que é feita só de sobreviventes, porque a cabeça deles é tão pesada que a grande maioria morre afogada no bebedouro. A gente ri e concorda com ele. Agora, sabe-se lá o que os cultivadores desta tal raça falam do nosso Árabe... Ou talvez a gente até saiba, mas nem liga. É tudo uma questão de ponto de vista, de perspectiva.
Nesta nacional veremos um bocado de novo: a primeira prova oficial da ANCAF, revista Cavalo Árabe num formato diferente, as estrelas da raça que vão despontar, o garanhão que terá a oportunidade de contribuir de forma contundente para a perpetuação de nossa criação. E faremos o que temos o privilégio de fazer como seres humanos: celebrar, aplaudir, criticar, tomar partido.
Foto: meubazar
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