Thursday 2 April 2020

Pé de Vento



Quarentena por causa da peste do Corona Vírus, em casa, um sofá, uma taça de vinho gelado, um livro. De repente, um pé de vento, uma porta bate, ouve-se o som de metal que cai sobre cerâmica. Estranho... CFH grita lá de dentro: será que trancou a porta? Desacredito. Afinal, a gente tem um peso de areia como apoio, pra garantir que isto não aconteça.

Marco a página do livro, dou um gole no vinho, levanto-me. Neste momento, lembro do Fernando Sabino e seu "Homem Nu" - não, nem se entusiasme, porque não vai ter cena de nudismo neste relato! Mas fica a dica para uma boa leitura durante o aquartelamento. Obs.: Também tem o filme com Claudio Marzo.

Na cozinha, a porta que dá para a área de serviço está fechada e a maçaneta no chão. Pois é, lei de Murphy. CFH pega e tenta enfiá-la de volta. Não funciona.

Problema formado: a saída dos fundos do apartamento é por ali e está trancada com corrente e tetra-chave para as quais não temos cópia, ou seja, não adianta simplesmente descermos pelo elevador social, subir pelo de serviço e abrir a porta.


É sexta-feira à noite, as luzes da área estão todas acesas e a máquina de lavar termina um ciclo de roupas coloridas que precisam ser postas para secar. Nada bom. Antes de chamar um chaveiro e arrombar a porta, existem duas possibilidades: passar pela janela do banheiro da suíte ou pela janela do nosso quarto.

Se a gente entra no box, sobe numa jardineira, a janela é giratória e dá para uma pessoa se esgueirar.  O empecilho são as plantas. Força de lá, força de cá, abrimos um tanto. Porém, a borda da jardineira não deixa seguir mais e é muito peso para tirá-la do lugar.

Avalio a possibilidade de passar pela abertura que temos e acho que dá, mas, não tenho onde me apoiar do lado de lá e vou dar bem em cima da máquina de lavar cujo tampo é de vidro.


Vamos para nosso quarto e eu tenho absoluta convicção de que, se subo na janela, consigo passar para a área. CFH não deixa e desce para pegar a escada do condomínio.

Penso em me rebelar e fazer o que imaginei enquanto ele não está, mas sei que não vai dar tempo. Quando volta, a escada é apoiada na laje do primeiro andar (estamos no segundo) e tento alcançar a área. Estou muito abaixo, não funciona.

Planos A e B abandonados, boto o bestunto pra funcionar mais uma vez.


Desde que viemos para este apartamento e compramos as maçanetas, me arrependo amargamente da escolha que fizemos. Elas são curtas e gorduchas, o que é péssimo para as molduras de madeira que enfeitam as portas, fica difícil acessar o parafuso que as prende e estão sempre moles. É dessa experiência que tenho uma chavinha que só não guardo pendurada no meu pescoço porque não arrumei um jeito ainda.

No meu momento de Eureca, catei minha chave milagrosa em seu esconderijo (nem CFH, nem a moça que toca o terror duas vezes na semana aqui em casa e nem o motorista da empresa sabem onde fica!); procurei um par de maçanetas que estivesse mais bambo e desmontei. Peguei uma das partes gorduchas com as duas barrinhas compridas de metal que as une e enfiei no buraco da porta maledetta.


Missão cumprida.

Sem garantias de que não vá acontecer de novo porque o parafuso ficou meio espanado, mas colocamos o peso de areia contra o vento de novo no lugar. Nada como viver perigosamente.

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