Na revista Cavalo Árabe
De início, um pedaço de tecido, nos dias de hoje, uma obra
de arte tecnológica. A sela passou por vária adaptações para o conforto dos cavaleiros.
A introdução do couro, no lugar do primitivo pano sobre o lombo do animal, foi
essencial em termos de melhoria, assim como a invenção dos estribos pelos
chineses, que contribuíram para o equilíbrio, o controle e a segurança na
cavalgada. Aos poucos o material usado para compor a sela diminuiu de peso e
aumentou em flexibilidade, o que permitiu que o cavalo se sinta mais
confortável e relaxado, desenvolvendo passadas mais leves e fazendo transições
suaves.
Um tipo de sela que surgiu em algum momento da história é a intrigante
side-saddle, atualmente mais comumente vista nas competições equestres. O
desafio imposto ao cavaleiro, na verdade à amazona, é grande. No entanto,
assistimos a demonstrações de destreza e até velocidade que nos deixam de boca
aberta: imaginem as torções impostas ao corpo e o impacto causado nos ossos
pelo movimento!
Até os homens montaram em selas de lado em um momento ou
outro na utilização do cavalo como meio de transporte. Basta pesquisar
gravuras, pinturas, esculturas e escritos. Inicialmente o cavaleiro efetivamente
se sentava numa cadeira que tinha apoio para os pés. E mesmo após o surgimento da
sela que permite tocar cada flanco da montaria com as pernas, a side-saddle
continuou servindo, por exemplo, como artefato de guerra quando usada por
soldados que assentavam fios de comunicação telefônica ao longo de estradas. Ou
para que a pessoa que semeasse o campo tivesse mais amplitude de movimento.
Porém, a sela de lado perpetuou-se como um meio de imposição
de comportamento ao sexo feminino: o sentido de propriedade – aquele do tipo
“mulher não pode fazer isso”: é vulgar, não é feminino, não é natural, no caso,
montar como um cavaleiro. Além disso, havia a crença de que as damas não têm a
mesma capacidade para performar que o homem. De início a amazona não tinha o
controle do animal e era guiada por outra pessoa pelo cabresto. O mito da
incompetência do “sexo frágil” foi decisivo para o desenvolvimento das técnicas
da montaria de lado e do aperfeiçoamento dessa sela.
A falta de praticidade e a teimosia de algumas mulheres viriam
a mudar esse “status quo”. Um forte incentivo era a sua participação em
esportes como a caça. De início, para esconder o fato de estarem montando uma
sela normal, desenvolveu-se uma peça de vestuário feminino que mais parecia um avental,
amarrada ao redor da cintura. Ou a própria saia ou um casaco que possuíam uma
cauda imensa e eram arranjados sobre o lombo do cavalo para acobertar a
ousadia. E pasmem: sob tais paramentos, a pobre figura usava um vestido normal
e ainda um par de calças compridas!
Até que ponto as convenções antigas obrigaram pessoas a
burlar as regras? A ponto de montar uma sela “masculina” e escamotear uma perna
falsa sob a manta como demonstram peças de museu! Este truque parece ainda ser
utilizado pela indústria do cinema: há quem diga que a atriz Elizabeth McGovern
(ou um dublé), em seu papel de Lady Grantham, no filme recém-lançado Downton
Abbey, usa a terceira perna numa das cenas e, por desatenção dos produtores os
truques cinematográficos não esconderam a perna real. A conferir.
Montar de lado é um esporte praticado em determinado tempo, tem
começo, meio e fim. Mas para o dia a dia, melhor ficar com a sabedoria popular:
não é possível querer a frente das coisas olhando-as de lado.
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